Pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos).
Psicografia de Francisco Cândido Xavier.
Livro: Fé. Lição nº 16. Página 54.
Conta-se que, em certa ocasião, na casa dos apóstolos de Jesus, em Jerusalém, o trabalho de atendimento aos necessitados havia recrudescido.
Simão Pedro era o alvo das solicitações e das aflições.
Petitórios e queixas.
Quantos haviam escutado referências ao nome de Jesus e aos prodígios de amor que o Mestre realizara, vinham de longe…
E suplicavam…
E clamavam…
Muitos traziam querelas, outros carreavam perturbações.
Não raro, irmãos em demanda familiar, entravam em rixa ali mesmo, no recinto da fraternidade, trocando injúrias e pescoções.
Viajantes em extremo desespero abordavam a generosa moradia, implorando consolação.
Muitas vezes, os rogos se degeneravam em gritaria e palavrão, frustrando a tranqüilidade do santuário.
De vez que assumia a direção do grupo, era Pedro quem mais socorria os infelizes, mas, por isso mesmo, era mais intensamente policiado pelos olhos da crítica.
E as censuras contra ele desbordavam, aqui e além.
Por que consentia em receber tanta gente desorientada?
Como se entregava a delinquentes, quando se sabia responsável pela instituição?
Com que razões articulava tantas gentilezas, em favor de pessoas evidentemente desclassificadas?
Por que cercar-se de tantos tipos considerados malfeitores?
Ante a onda de reprovações que se fazia sempre mais alta, Tiago, filho de Alfeu, o lidador do Evangelho mais vigorosamente agarrado aos textos antigos, procurou Simão e comunicou-lhe a decisão de afastar-se.
Não tolerava a situação que categorizava por desequilíbrio e desordem.
Dali em diante, habitaria um tugúrio isolado na saída para Jope.
Aspirava à meditação e ao repouso.
Ansiava por sossego na vida espiritual…
Simão tentou acalmá-lo, prometeu condições melhores em futuro próximo, apequenou-se e pediu a reconsideração do companheiro.
Tiago, porém, foi inflexível.
Em dias rápidos, promoveu a mudança e encasulou-se em risonha choupana, rodeada de verdura e batida de sol.
Ali se confiava ao estudo dos apontamentos evangélicos, tratava de flores, admirava os insetos e louvava o Senhor, através das orações de hora certa.
Escoaram-se os dias, semanas, meses…
Tiago, insulado em quietude e reflexão, recordava Jesus com inexprimível saudade…
Tantas vezes, vira o Mestre, gloriosamente redivivo, depois da morte…
Por que não lhe reaparecia Jesus, agora que se consagrara a mais profundo recolhimento?
Não se achava ali, plenamente disponível, entre o silêncio e a oração?!…
Uma noite surgiu em que a ausência do Mestre mais lhe pesava na alma…
Concentrou-se em rogativas, lembrou-o e chorou…
E chorava, quando viu alguém, a se lhe abeirar do refúgio, banhado de luar…
O desconhecido vinha de passo ligeiro, como quem fazia o seu próprio caminho, varando a noite…
Extasiado, o apóstolo reconheceu o itinerante que, afinal, se lhe revelou, aureolado de luz.
Era o Cristo de Deus.
O discípulo ajoelhou-se e alongou os braços para recolhê-lo com mais largueza de júbilo.
O augusto viajor, no entanto, passou por ele, sem deter-se.
O filho de Alfeu levantou-se, de espírito opresso, correu-lhe no encalço e gritou:
– Senhor! Senhor!… Acaso, não me vês o coração mortificado de saudade? Onde vais que não me vês a necessidade de ti?
Jesus voltou, abraçou-o, de leve e comunicou-lhe, num sorriso:
– Tiago, estás a salvo de lutas e tentações… A virtude te abençoa no recanto de paz. Vou ao encontro de Pedro, a fim de aliviar-lhe o fardo de humilhações e de lágrimas, no amparo aos nossos irmãos!…
Dito isso, o Celeste Benfeitor prosseguiu viagem…
Tiago, entretanto, naquela mesma noite, reuniu os pertences pobres num carro de mão e retornou ao pouso antigo.
Bateu à porta que se lhe abriu, acolhedora, e abraçando Pedro que lhe veio ao encontro, pode apenas dizer: “Eu estou aqui.”
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